terça-feira, 11 de março de 2014

11/03/2014 - Manifestações Brasileiras, Meritocracias e Victor Hugo

Victor Hugo foi um visionário e conseguiu captar em suas obras os grandes problemas sociais, ainda podemos usá-lo como análise para acontecimentos atuais. Quando a “Revolução dos 30 Centavos” começou no Brasil, manifestantes se apropriaram de máscaras baseadas no quadrinho “V de Vingança” de Alan Moore, precisamente na máscara do cinema, acho que não leram o quadrinho para captar a essência, podemos deduzir que tinham assistido ao filme, se não assistiram deveriam assistir. De qualquer forma a máscara do quadrinho e do filme foi baseada no rosto de Guy Fawkes, homem que foi condenado à morte por tentar matar o rei. A essência está na luta contra o poder, é isso que interessa. Ainda no mesmo quadrinho temos inspirações por todos os cantos referindo-se a obra de Victor Hugo “Os Miseráveis”, para quem assistiu ou leu o livro sabe que ali reside a verdadeira essência de nossas “revoluções”.

Victor Hugo sabia bem como funciona uma manifestação, tentativa de revolução. De um lado temos pessoas sofrendo por conta do sistema, fica latente o mito da eficiência da meritocracia, como meritocracia podemos pensar nos empregos por concursos públicos, no sistema de notas através de provas nas escolas, mas na prática a meritocracia é baboseira, em um mundo extremamente capitalista e cheio de interesses, sem imparcialidades, a meritocracia é bandeira competitiva, não funciona, em concursos públicos mesmo, não importa a nota que você tirou, se você tiver “tempo de casa” ou um diploma, ganha alguns pontos para acrescentar ao seu resultado e passará na frente de algumas pessoas que podem muito bem ter tirado nota maior. Na vida a meritocracia vira discurso de palestra motivacional, onde é a manipulação e não a necessidade do funcionário se superar que está em foco. Para piorar, a condição humana é tão miserável que muitas pessoas não vão vencer na vida por conta de suas faltas de oportunidades, não precisamos de meritocracia, precisamos de chances para todos, independente de suas capacidades, a capacidade pode muito bem surgir da oportunidade, mas é complexo. Quando li “Ratos e Homens” de Steinbeck ficou claro que a meritocracia não serve para todos, é oásis no meio do deserto, trabalhadores juntando dinheiro enquanto tanta desgraça acontece, nunca deixarão suas vidas miseráveis. Vejo ode à meritocracia por todos os cantos, quando pessoas que não têm onde morar ocupam alguma terra, aí vem o trabalhador mediano e desumano reclamar que “Porque não trabalham como eu para conseguir sua terra?”, mas esquecem que trabalhar nem sempre é certeza de conseguir seu lugar para morar, nossos problemas sociais vão além disso, precisamos esquecer nossas lutas e méritos para sermos mais humanos e aprendermos que dignidade não pode vir do mérito, mas de um direito natural das pessoas. A velha frase “Dê-se ao respeito para ser respeitado” é ilusão, pressupõem que você só respeitará se a pessoa merecer, ora, quem é você para julgar quem merece ou não? Trate todos com respeito, independente de merecimento.

Voltemos ao Victor Hugo, sua obra mostra perfeitamente como o problema social afeta as pessoas, existem os revolucionários que estão se manifestando, mas são alvos de todo sistema construído, são alvos dos poderes que desejam aniquilá-los para que a população não seja livre, são alvos da população medrosa que, mesmo representada por eles, não vão à luta e lhes negam abrigo. Podemos comparar este segundo vilão como o pior, pior que o sistema são os simpatizantes da preguiça ou do sistema, os conformados fazem tanto estrago quanto ditadores, eles zombam das manifestações, desejam que patrimônios públicos fiquem inteiros, na verdade acham que uma estátua, um prédio histórico e toda estética de uma cidade de fachada valem mais que suas próprias liberdades, é triste, Victor Hugo percebe o sistema e a desigualdade destruindo o povo, para que o povo, no ápice de sua destruição, ache que não precisa ser salvo. Que tipo de distopia é essa que vivemos e sabemos muito bem como modernas, onde o homem aprisionado é extremamente egoísta e conformado, preferindo sossego à liberdade, preferindo estética urbana à liberdade? Tem algo de muito errado no coração humano, é mais difícil fazer o homem querer ser salvo do que aprisionar este homem.

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