sábado, 25 de janeiro de 2014

25/01/2014 - Em um Mundo Seriado não Há Inspirações, só Mediocridade

Una manera de definir la creatividad es ver lo que nadie ve. – Ferran Adrià

Prometi a mim mesmo que faria um capítulo para homenagear o cozinheiro Ferran Adrià, foi um momento incrível quando assisti sua entrevista no “Roda Viva”, é o tipo de momento que realmente muda a vida de um homem, algo tão difícil nos dias atuais, encontrar inspirações que mudem nossas vidas, e há muita inspiração no mundo, mas estamos fechados. Então o assunto será diferente, percebi que saí extasiado daquele programa, um cozinheiro falando sobre seu ofício como quem fala de arte, e ele é um artista, seus ensinamentos, sua técnica, tudo relacionado a ele, seus objetivos, suas ideias e ambições, que nada tem a ver com ganhar dinheiro, melhor ainda, já que a ode ao dinheiro está tão banalizada e parece ser foco de tudo e de todos, mas o foco deste texto é mais profundo, quero falar de nossos dias que estão eliminando nossas possibilidades de mudar e nos inspirar.
Assim que terminei de ver o programa fiquei de boca aberta, o tipo de programa que não me atrai, sobre um cozinheiro; para minha ignorância, nada podia sair dele que me interessasse, não que fosse preconceito, mas não era minha área, no entanto, não consegui parar de escutá-lo, e nem assistiria o programa, tinha assistido o programa anterior, estava longe do controle remoto e não queria pegá-lo, preguiça, mas mexia na Internet e jurava que desligaria a Tv assim que fizesse o que tinha que fazer online, não consegui, deixei o canal ligado, saí da Internet e vi que aquilo era o que eu precisava, que homem incrível. O problema é que eu escrevi sobre outra coisa; durante o programa foi o paraíso, depois pesquisei sobre o homem, então fui trabalhar no dia seguinte e outros milhões de assunto vieram à cabeça, aí está o problema, a vida é bombardeada de informações inúteis, pessoas inúteis, a velha mediocridade de sempre, e percebi uma coisa, o mundo conspira para nos mediocrizar, é duro, mas é verdade, não existem inspirações e todos estão em um barco decadente. Claro que generalizei, apesar de todos estarmos em um barco furado, é necessário muito foco e disponibilidade para fugir das distrações e não ser apenas um na multidão. Ser único... É isso que todos devemos querer, mas estamos em um mundo de contagem, onde todos representam um número, um mundo em série, de pessoas em série, de problemas em série, nada é individual, e todo brilhantismo só surge quando o homem quebra a barreira do coletivo para sua luz brilhar.
Essa inquietação surgiu quando percebi que não pensava mais em Ferran Adrià, ora, e toda aquela inspiração? E tudo que eu senti? Muitos homens brilhantes em algum momento da vida se depararam com outro humano brilhante, e inspirado por essa luta, personalidade ou realização, decidem que é a hora de deixar um legado, de mudar o jogo, de não ser nenhum número, de ignorar tudo e todos, ou melhor, ignorar tudo e todos que lhe atrasam o caminho, sabe, você sente, lá no fundo todo homem sente que está preso numa vida que não lhe diz respeito, não lhe agrega nada, que está longe de teus sonhos, realizações e desejos, e um corte profundo precisa ser feito, é hora de mudar tudo para finalmente ser alguém de relevância no mundo... É assim que funciona, a inspiração é a consciência atacada por um brilhantismo alheio, que finalmente dá aquele baque e grita em nosso âmago “Ei, faça algo, você deve tentar”, pode soar como autoajuda, mas o texto não é para ajudar ninguém, apenas para criticar a falta deste instante brilhante de inspiração, as pessoas se desligam facilmente de suas inspirações, afinal, não têm tempo para tais besteiras, então elas sentem, como eu senti ao ver Adrià, que algo está acontecendo, que algo precisa acontecer, é hora de mudar, mas então, você deixa passar, deixa pra lá, vai dormir, acorda, não depura a informação, não depura o instante de estalo, vai trabalhar, pega a condução, pensa numa vida tão concreta de dificuldades e obrigações irrelevantes que se fazem de obrigatórias, está tão embrenhado nesta vida, almoça, trabalha, volta para casa, pensa nas dores de cabeça, e é tanta coletividade, tanta coisa que lhe prende, bancos, conduções, família, amigos, absolutamente tudo, que subitamente Ferran Adrià desaparece de sua essência, a inspiração virou transpiração (não de ação, mas de cansaço e suor alienante) que para você tanto faz. Talvez este texto sirva para trazer as palavras de Adrià novamente ao meu “espírito”, mas principalmente para salvar as inspirações, os momentos de inspirações.
De nada adianta se deparar com aquela vida magnífica, aquele mestre incrível, aquela inspiração que só acontece raramente, como em um eclipse, se depois disso for apenas uma lembrança, apenas a imagem de um cara que venceu ou que representa algo, ou pior, de um louco, de um mundo estranho e irrelevante, porque não é, é relevante em sua máxima potência porque mexe com nosso interior, mexe com quem somos.
Vi em algum lugar, talvez no filme “O Espetacular Homem Aranha”, uma professora dizendo que só existe uma trama, e esta trama é “Quem sou eu?” (não sei se é de outro lugar), tudo se resume a isso. E você é aquele que se depara com um momento de mudar de vida, e tenta mudar, mesmo que isso o destrua, ou você é aquele que se depara com o momento de mudança interior e deixa pra lá, mas ao deixar pra lá como se fosse unicamente um brilhantismo alheio que nunca estaria ao seu alcance, e aos poucos vai sumindo, desaparecendo na multidão seriada, sendo mais um número, mais um entregue às obrigações? Sim, no mundo de hoje a responsabilidade foi elevada ao posto de escravidão, não, você não tem responsabilidade com seus filhos, com sua família, seu trabalho e mediocridade, não há responsabilidade alguma, a responsabilidade foi roubada por um mundo de máquinas, por um mundo sem sentimentos, de pessoas que nascem sem pra quê, vivem sem pra quê e morrem sem terem vivido; a verdadeira responsabilidade deveria ser aquela de você consigo mesmo apenas... Quando critico a nova responsabilidade falo em ignorá-la, tomar tua vida e teu legado, perceber-se único e com um papel realmente importante que transcenda todos ao seu redor, ser unicamente quem você é, porque só existe uma trama nesta vida, e esta trama é “Quem é você?”, e o mais importante, “Quem você quer ser?”, e desculpe, mas se tua resposta for toda questão das condutas de sempre, da vida, do trabalho, do pai ou mãe de família, então você não é ninguém, você é mais um, e como mais um, nenhuma inspiração servirá para tirá-lo deste patamar para um superior. Só me interessam os que transcendem, Adrià é um cozinheiro brilhante, o homem fez um mousse de fumaça, deseja um sorvete quente, um caramelo salgado ou até a bola quadrada, porque não é no brilhantismo da cozinha, mas no brilhantismo de fazer o impensável, da criatividade, da inteligência que não está ligada meramente aos testes de QI ou aos concursos públicos, mas da criatividade do homem que é um Deus, do homem que faz seu mundo, de um mundo que pode ser criado, manipulado, do tudo é possível... aí está o brilhantismo.
Espero que a inspiração volte e que eu não me perca em informações soltas no espaço, nas brigas cotidianas, na mediocridade das relações humanas que tanto me fazem pensar, mas me impedem de ser eu, do método que não transcende, da normalidade banal, quero inspirações que mudem minha vida, que eu esteja aberto a elas, que elas sejam assimiladas, porque vivemos em um mundo onde nada é assimilado, as coisas são debatidas por mentes mui inteligentes, são discutidas ferozmente apenas como duelo de informações ou de quem é o mais esclarecido, para depois sumir e dar lugar a outro debate, mas nada criador, ninguém cria nada com aquilo que sabe, é vergonha lamentável que a humanidade esteja gastando suas possibilidades de brilhantismo jogando ideias ao vento e não transformando tais sabedorias em realizações... Tais criações podem surgir de diversas maneiras, não apenas em debates no Youtube para amanhã serem perdidos e esquecidos, ou textos fugazes em blogs, mas que este blog tenha um conceito que transcenda o próprio blog para a imortalidade, que o criador guarde seus textos, depure as palavras, tenha um cuidado, não apenas foco no número de acessos de semana em semana, texto sem qualidade ou preso às necessidades de usar palavras chaves que serão procuradas no Google para trazer acessos, só acessos e nenhum olhar atento, e quando piscar, perder seu valor porque é hora de outra coisa passageira, tem que ser como em “Cisne Negro”, tem que ser perfeito, e digo mais, eterno... Tento trazer o eterno para este projeto, tudo é construído almejando uma única obra, um conceito que depois se desprenderá do meio e mostrará um retrato da realidade e da humanidade... A eternidade se perdeu nos dias de hoje, infelizmente... Então vão seguindo, parados, evaporando, e quando você menos percebe, aquela frase maravilhosa que você leu em um livro, aquele quadro incrível que olhou por um minuto, mas que representou todos os seus anseios, quando menos esperamos, a campainha toca, o telefone treme, é hora de bater o catão de ponto, ou é hora de entrar na fila do desemprego, e todas as preocupações banais destroem seus momentos diante da inspiração, e a inspiração deixa de ser inspiração para ser o amargo suor do cotidiano.

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