sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

21/02/2014 - A Ilusão da Necessidade de Permanecer Efetivado Para Pais de Família

A escravatura humana atingiu o seu ponto culminante na nossa época sob a forma do trabalho livremente assalariado. - George Bernard Shaw

Após escrever um texto sobre “Trabalhar tem que ter graça”, eis que me deparo com a resistência por parte de quem “Necessita Trabalhar” para sustentar filhos, família e estas coisas mais emergenciais que tiram a liberdade de escolha do indivíduo, ou a liberdade e possibilidade do indivíduo ser feliz e pensar em si mesmo. Concordo que aquela regra pode não funcionar para todos, porém, isso abre uma questão interessante de aprisionamento pela obrigação, e mesmo assim, o que é obrigação? É ser responsável? É pensar nos outros antes de pensar na própria jornada? A única solução para este problema complexo encontro na vida de um dos grandes homens que existiu, Sidarta Gautama, o Buda, creio ter lido em “Uma Breve História do Mundo” que o mesmo já era pai quando desistiu de absolutamente tudo para encontrar sua liberdade, e acredito que, o desprendimento de Buda, se pode nos ensinar nosso verdadeiro lugar ou necessidade de autoconhecimento, é indício de que hoje os seres humanos estão mais responsáveis com seus queridos, porém, isso resulta no aprisionamento que relatei. Buda é exemplo de vida? Não posso dizer. Cada um tem para si os líderes e exemplos que deseja, e gostaria que isso acontecesse como maneira do homem saber viver e buscar seus sonhos, nunca como conformismo pelo sucesso alheio; o homem moderno carece de individualismo, carece de peculiaridade, falta-lhe personalidade ou força de saber que no mundo só há ele, porque é impossível que qualquer pessoa viva sua vida por você. O homem atual, pelo menos aquele que está embrenhado no jogo capitalista dos laços obrigatórios e não afetivos, está preso e não tem como voltar. Aquele discurso anterior sobre Trabalhar Ter que ter Graça ainda é válido, pelo simples fato de que a liberdade é nosso bem maior, independente daqueles que estão conosco, serei frio ao extremo e não existe necessidade de ser responsável por alguém se isso lhe tirar do jogo do mundo, tirar-lhe do jogo da própria vida.

O mundo atual é o mundo das demandas, pessoas são empregadas e demitidas todos os dias, há rotatividade e oportunidade por todos os lados, as pessoas não se ligam em quesito de afeto, mas o mercado é igual, as pessoas dificilmente criam vínculos com seus empregos, transformando tanto laços afetivos quanto de fidelidade empregatícia em um detalhe de épocas passadas, isso é bom, mas é trágico, ao mesmo tempo em que demonstra liberdade, cria insegurança de não saber o que virá amanhã, mesmo sabendo que amanhã virá outro emprego, e outro, mais outro, nenhum vínculo e, portanto, certeza para que este medo de ficar desempregado não passe de uma ilusão. Claro, o mundo do trabalho é cruel, algumas pessoas ficarão à margem, são as consequências dos azarados ou excluídos, e é nessa verdade terrível de ficar à margem que faz com que pessoas capacitadas sintam-se no perigo de estar à margem no desemprego, mas a pessoa empregada que têm seus filhos, sua família e seu emprego não está tão à margem assim, mesmo que estivesse, vivemos em um país que facilita tudo (e não critico este facilitador), temos bolsas de todos os tipos e instituições para amparar desamparados, a bondade humana virou show e o bom-samaritanismo faz parte do currículo humano, onde muitos, empresas ou associações gabam-se da qualidade por seu nível de “ajuda ao próximo”, tudo bem que muitas das ajudas podem ser meros placebos ou prisões onde o homem se mantem vivo enquanto não progride ou não tem tempo para pensar em seus sonhos, é sempre a ajuda almejando tirar-lhe a necessidade de ajuda. O homem, olhando por este momento, que tem sua família e necessidade de criação, esquece que seria amparado, pelo medo da possibilidade de ser excluído (existente) e não tem mais coragem para se desligar e encarar outro serviço onde, finalmente, os laços que defendi seriam melhores e contribuiriam para um engrandecimento humano.

É triste, mas o homem moderno com filho, família e necessidade está fora do jogo opinativo, não tem a possibilidade nem de pensar na felicidade pessoal, logo, não pode opinar sobre a necessidade de manter-se no emprego independente de existirem ou não laços afetivos no mesmo, o homem que se enquadrada nesta maldição é eliminado em matéria de voz ativa, não tem moral para julgar as coisas com a mente fresca, o medo é seu combustível, a insegurança principalmente, e onde existir conforto existirá a ilusão de que seus filhos ou famílias estarão bem, o que não é verdade, porque, a não ser que você mame nas tetas do governo como um parasita “empregado público”, a rotatividade e exclusão ainda será maior que sua necessidade de estar empregado, até mesmo de sua competência para estar empregado, os elos empregatícios modernos independem da competência e da vontade do empregado.

Podemos pensar até nos empegados públicos, estes não estão tão seguros quanto os outros, embora pareça em um nível diferente, estes vivem à margem do conformismo e da infelicidade, assistem todos “progredirem” enquanto eles continuam os mesmos, e são até mais escravos que os anteriores, estes trazem a verdade de sua efetivação, com isso, perpetuam laços frívolos que dificilmente serão rompidos se não for pela própria vontade, o descontentamento e falta de perspectivas cria a rotatividade, onde inconscientemente pulam de galho em galho, pedindo remoções para outros ambientes, tentando outros concursos para sair daqueles empregos que conseguiram, a vontade de mudar gera rotatividade. Se no primeiro caso era uma imposição cruel do mercado de trabalho, onde não existe algo que se faça para manter o emprego, no público é o inconsciente que age criando a vontade de rotatividade na vontade do funcionário, de qualquer jeito não ficarão ali muito tempo, a diferença é que um roda por fora, o outro salta por dentro. Até para o funcionário público seria difícil usar do argumento de precisar de tal emprego, ele precisa, mas inconscientemente tenta mudar de ares em um lugar que parece estático. Os dois estão no mesmo patamar, também são instrumentos de uma força maior que ora expulsa-os de seus lugares, ora suas mentes negam isso, por medo de que o fator primeiro aconteça, e tentam agarrar-se cruelmente ao posto que ocupam. É uma sociedade ambígua, talvez hipermoderna, onde os dois opostos se digladiam.

Diante desta complexidade, caberia ao homem admitir a rotatividade em qualquer posto que ocupe, para, então, ter coragem de sair por conta própria e invadir o ambiente de trabalho que mais lhe agrada, afinal, qual a diferença entre a rotatividade imposta pelo mercado de trabalho, a rotatividade criada pelo inconsciente que leva o funcionário público a fazer aquilo que o mercado do desempregado faz, ou a decisão consciente, mesmo tendo filhos e família, de também se largar nesta rotatividade e ir para “um lugar melhor”? Não há diferença em matéria de resultados, há uma diferença importante, a diferença está em, no último caso foi uma decisão escolhida, foi sua liberdade exercida, algo parecido com o que Buda fez, tentativa (mesmo que ínfima dentro de nossas diversas prisões) de honrarmos nossa peculiaridade, nossa decisão de mudar as coisas e de agarrarmos as rédeas da vida e não sermos apenas marionetes dos fatores externos ou angustiantes de nossa nova era. Com isso explicado, creio que até mesmo um pai de família poderia se desligar de suas obrigações e pensar em sua jornada, a obrigação é uma ilusão criada pelo mundo da necessidade, do mundo dos extremos e das ambiguidades.

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